Tio Colorau

Por Erasmo Firmino

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Amanda Gurgel, 31 anos, é professora em Natal, capital do Rio Grande do Norte, e integra a lista dos 57.434 vereadores eleitos no último dia 7 de outubro. Como ela, Eleika Bezerra, 69, que também dedica a vida à educação na capital potiguar, conquistou uma cadeira na Câmara dos Vereadores. Ambas poderiam ser, apenas, mais dois nomes, em meio ao total de 2.895 professores eleitos vereadores, no País, neste ano. Mas Amanda, candidata do PSTU, e Eleika, do PSDC, se destacam por uma postura ousada e ética. A jovem professora Amanda ficou famosa, no ano passado, ao expor seus vencimentos de R$ 930, durante uma audiência pública na Câmara Municipal de Natal, para mostrar, didaticamente, que um professor ganha um salário muito baixo para ser “redentor” da educação brasileira.

“Estão me colocando numa sala de aula, com um giz e um quadro, para salvar o Brasil?”, questionou Amanda. A sessão foi filmada, e o vídeo foi visto por mais de 2,3 milhões de pessoas no YouTube. A exposição a tornou a vereadora mais bem votada em sua cidade. Eleika, por sua vez, surpreendeu seus eleitores ao anunciar que destinará seus proventos como vereadora a ações voltadas à educação. “Me acho no dever de abdicar do salário para lutar por uma causa à qual dediquei toda a minha vida”, anunciou. Na semana passada, Eleika e Amanda podem ter ganho um incentivo para continuar firmes em suas batalhas.

A Comissão de Constituição e Justiça, da Câmara dos Deputados, aprovou o Plano Nacional de Educação (PNE) que, além de destinar 10% do PIB para a educação, prevê isonomia salarial dos professores em relação às demais profissões de curso superior. Hoje, eles ganham, em média, 60% do que recebem outras categorias. Para um país que multiplica suas riquezas, esses ganhos desproporcionais representam uma realidade bem pouco honrosa, que tem raízes históricas. Em seu livro, 1822, o jornalista Laurentino Gomes lembra que no primeiro censo demográfico realizado no País, em 1818, ou seja, quatro anos antes da independência, se constatou que a taxa de analfabetismo no País chegava a 99% da população.

Os Estados Unidos, por outro lado, já tinham um número de analfabetos próximo de zero quando declararam sua independência, em 1776. Ou seja, partimos em desvantagem, desde os primórdios da nossa história como nação soberana. Evoluímos, desde então, enquanto sociedade, mas alguns aspectos ainda apresentam desempenho medíocre. Em 2009, havia seis milhões de alunos matriculados no ensino superior, um quarto do total que já deveria, efetivamente, estar na faculdade. Se levarmos em conta a evasão de estudantes, o número de formandos cai para quase a metade. Ou seja, o descaso com o assunto continua firme, desde os tempos de d. Joao VI.

 A aprovação do PNE aumenta a esperança de que essas distorções seculares possam ser corrigidas. A pressão da sociedade – e de um mercado de trabalho que carece de profissionais capacitados – pode garantir a manutenção dessa meta no Senado. Mas como disse à DINHEIRO a empresária Viviane Senna, presidente do Instituto Ayrton Senna, reduzir o debate ao volume dos recursos é muito simplista. O grande problema é como implementá-lo. Vale, nesse caso, inspirar-se no idealismo das professoras de Natal. O País pode e deve ajustar o foco no ensino da sua população para apropriar-se de suas riquezas e fortalecer a dignidade promovida pelos exemplos de Amanda e Eleika.

Texto de autoria de Carla Jimenez, publicado originalmente na revista IstoÉ Dinheiro.

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